Arquivo de 04/07/2009

O Tucano da Goiabeira

Publicado: 04/07/2009 por Luiz Vieira em Contos

Levantou-se hoje um pouco mais triste que os dias passados. Não sabia bem o motivo, mas não se sentia bem consigo mesmo. Olhou a janela como se se procura algo pra culpar, ou uma imagem que lhe retomasse a vontade de viver. Calou-se como se cala a criança ao ser reprimida por um professor “linha grossa”. Viu na goiabeira um Tucano. Pelo que sabia não havia tucanos naquela região do país, e se havia nunca tinha passado pela sua frente, muito menos na sua janela. Bico longo e amarelo, uma mancha negra no final, uma mecha branca no peito e o resto da penas pretas. Olhou, olhou e esqueceu. Foi ao banheiro cumprir seu ritual matinal, vestiu-se e foi para o trabalho.

Esqueceu-se aos poucos da tristeza que havia lhe invadido o espírito naquela manhã. Atendia desesperado seus clientes, forjava um belo sorriso. – Bom Dia. – Seja bem Vindo. – Uma boa tarde para o senhor. – Volte sempre. Etc. Nos pequenos intervalos enquanto tomava água pensou que em muitos anos de vida nunca tinha visto um Tucano e que nunca se sentira tão encantado em frente a uma imagem. Começou a se culpar. Porque não olhei por mais tempo. Talvez chegasse atrasado, mas quantas vezes não chegara atrasado no trabalho por motivos bem mais fúteis. Devia ter prendido ele, para que ele ficasse em casa para sempre. Mas não tinha nenhuma gaiola. Conformou-se e voltou ao trabalho. Agradeceu em seu íntimo a bondade divina em conceder-lhe um momento tão especial.

Hora do almoço. Voltou pra casa. Abriu desesperado a porta, na esperança dele ainda estar repousando na goiabeira da janela. Não deu sorte, não havia nada mais. Resignou-se. Comprou comida. Pensou enquanto comia. Não é possível haver um bicho destes na minha janela, afinal não estamos na Amazônia, quem deixaria o coitado sair. Será que teria fugido? Será que o dono o procurava? Será que realmente era um Tucano? Será que não estava louco? Angustiado calou-se. Uma brisa leve tocou-lhe o rosto, o dia passava devagar. Ele voltou ao trabalho.

Luiz Vieira